quarta-feira, 21 de maio de 2014

Let's play.

Alice took up the fan and gloves, and, as the hall was very hot, she kept fanning herself all the time she went on talking: 'Dear, dear! How queer everything is to-day! And yesterday things went on just as usual. I wonder if I've been changed in the night? Let me think: was I the same when I got up this morning? I almost think I can remember feeling a little different. But if I'm not the same, the next question is, Who in the world am I? Ah, that's the great puzzle!' And she began thinking over all the children she knew that were of the same age as herself, to see if she could have been changed for any of them.

Carroll, Lewis. Alice's Adventures in Wonderland. Peguin Popular Classics.

sábado, 10 de maio de 2014

ARTePOP, a Lei de Gaga.

Se ela emerge na ordem do discurso das divas da música pop com The Fame, em Born this Way Lady Gaga deixa claro que não é só mais uma loira nos convidando para apenas dançar, mas que veio para fazer arte, bagunçar e tirar as coisas da ordem, estabelecer a diferença. Para falar de uma traição à qual estava sofrendo, retira Judas da Bíblia. Durante a transição do The Fame Monster para o Born this Way chovem referências ao cristianismo, o que imediatamente colocava a cantora entre polêmicas, ao mesmo tempo em que ela afirma a dificuldade de se desvincular de algo que era/é parte dela e de todos que vivemos nesse mundo marcado pelo pensamento cristão. Porém, ela vai além nos afirmando que é possível inventar outros modos de vida mesmo com isso que nos é ofertado. Explorando os limites e utilidades do corpo, faz intervenções no seu próprio durante o período que lança Born This Way. Lady Gaga vai, ainda, bagunçar os limites da divisão de gênero, circulando como Joe Calderone por um período. 

As baixas vendas de seu mais recente álbum ArtPop, bem como a não-lotação dos shows aqui no Brasil, faz muitas pessoas equivalerem isso a um sinal de fracasso. Porém, há que se perguntar se os números (incluindo o dinheiro) podem ser as medidas do sucesso ou da genialidade de um artista. O mercado tem suas regularidades, o que é rentável, o que fará sucesso e nesse jogo muitos se inserem e jogam-no. Nessas mercadorias, normas de modos de ser são vendidas e compradas por todos aqueles que acessam a música, o programa televisivo, as novelas, entre outros. E se a Lady Gaga fracassa é por não entrar na fórmula do que é vendível.

Em sua passagem pelo Brasil, pude ver, ouvir, e sentir no show de Gaga em Porto Alegre algo que é da ordem do estranhamento. Estranhar por muitas vezes não entender o que ela quer apresentar, o que por sua vez me faz pensar no caráter sensível da cognição. Misturando conceito e imagens, ela perturba. Lembro não entender porquê tantas referências a quando ela era uma pequena menina de New York durante o show, nem ao fato de ela se colocar como a Mother Monster(mãe) de seus Little Monsters(seus fãs), muito menos suas constantes afirmações de que vive por/para/com sua arte.

No entanto, impossível não entender do que se trata quando se fala de Lady Gaga depois de percorrer seu trabalho. Semana passada, sua turnê ArtRave estreou e conseguiu tirar minutos de minha atenção na procura pelas imagens do show. Referências à arte não faltam, misturando conceito, dança, vídeo, moda, entre outros, estamos vivendo um espetáculo. Lady Gaga é fruto de nosso tempo imagético, não sendo apenas uma cantora. Se quisermos, podemos atribuir a ela uma revolução no modo de fazer videoclipes, já que são frequentes seus videos que extrapolam os limites de uma música, bem como são marcados por uma história/narrativa, sempre aberta aos múltiplos sentidos.

Já perdi a conta de quantas vezes já assisti o vídeo de G.U.Y. Como sempre na primeira vez só foi possível estranhar e não compreender. Entre os significantes que vão se sucedendo na tela, as aberturas aos múltiplos sentidos me conquistaram. Como em outras músicas do álbum, Lady Gaga faz referência (e não reverência!) à mitologia grega, mistura passado e presente querendo fazer um futuro diferente. Frente às duras pedras do mundo adulto, Lady Gaga ao "fazer arte" mostra a vivacidade da criança que a habita, o que podemos ver em suas postagens no instagram em que ela brinca com uma boneca que imita Venus enquanto sua música toca ao fundo.

Falando com os fãs em um show, Lady Gaga diz que eles estariam fazendo uma revolução ao afirmar seus modos de ser, sempre diversos e passíveis de estranhamento. É aí que consigo enxergar toda a potência estética que interpela a política, nosso modo de estarmos em relações uns com os outros. Lady Gaga é uma profana. Profana o sagrado, aquilo que não deve ser tirado do lugar. Com o que nos é dado (e às vezes imposto) por pertencermos à humanidade, outras expressões vão ganhando formas em suas obras. Com os restos arqueológicos, Lady Gaga vai inventando a vida. Que possamos fazer o mesmo em nosso cotidiano!

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

É possível ser feliz sozinho? - Parte II


A experiência de reler algo escrito há um tempo atrás sempre traz um misto de constrangimento e diversão. Colocar em evidência que deixamos de ser quem éramos e ao mesmo tempo perceber que algumas coisas seguem exatamente iguais. Ter que responder a terrível pergunta se é possível ser feliz sozinho é algo que continuo me dispondo a tentar responder. Lembro que aquela pergunta vinha de uma novela que tinha como tema Wave do Tom Jobim como tema de abertura. "Vou te contar / os olhos já não podem ver / coisas que só o coração pode entender / fundamental é mesmo o amor / é impossível ser feliz sozinho." 

O texto anterior briga na verdade com o ideal de que somente uma pessoa nos completará. Encontrando-a temos nosso feliz para sempre. Podemos achar uma bobagem, uma ficção, uma invenção, mas é algo que está tão enraízado em nossa cultura e nos subjetiva sem que conseguimos ter noção disso, o que é possível de ser observado na monogamia como único modo de relação amorosa e sexual possível. Se você escapa a essa modalidade, os estranhamentos e as perguntas insistirão em te atormentar: qual seu defeito? qual a sua falha? Michel Foucault, em uma entrevista intitulada de Amizade como modo de vida, fala que as relações homossexuais podem possibilitar outro modo de se relacionar, por não estarem tão bem codificadas como as relações entre homem e mulher estão, embora existam muitos gays que querem uma relação nesses moldes tão bem estruturados. A meu ver, essa é mais uma evidência de como o amor a uma única pessoa que nos completará é tão forte. 

Anos depois, hoje, tenho outra posição: é impossível ser feliz sozinho! Logo eu tão desafeito a lógicas de pensamento que naturalizam o ser humano como um ser social, que prescinde de outros. O tempo que separa essa escrita da anterior me ensinou que o lugar do outro em nós é vital. Encontrei pessoas que alegraram e engrandeceram muito meu viver, e outras tantas que me entristeceram e fizeram-me sentir a menor das criaturas. No entanto, as dores dos desencontros são pequenas frente ao sentimento de estar solitário em uma situação, sem poder compartilhá-la. 

Somos subjetivados a acreditar que o porto seguro está somente em uma pessoa, mas, em nossos barcos, navegamos. Ancoramos em diferentes portos, de modo que podemos encontrar diferentes pessoas que nos acolham sob diferentes perspectivas. Inclusive em um relacionamento a dois que não necessariamente nos convoque a uma entrega total. "O resto é mar. É tudo que não sei contar".